quinta-feira, 30 de julho de 2015

O desafio de ser



São João Paulo II, falando à família, disse-lhe: “família, torna-te aquilo que és!”. Creio que este apelo pode ser dirigido a cada um de nós: Pedro, Tereza, Sônia, Rafael: tornar-te aquilo que és! De fato, existem várias possibilidades que podem nos levar à perda de nós mesmos, fazendo com que nos tornemos alheios a nós mesmos e deixemos de ser. Esse convite do Papa é atualíssimo.

A perda das próprias raízes nos desconfigura. Nós somos o que fomos. Somos a nossa história. Por vários motivos, podemos querer apagar o que se passou conosco: a cidade onde moramos, a situação de pobreza que vivemos, as dificuldades que passamos. Por nos encontramos em um patamar melhor, cancelamos tudo que se passou conosco e não compreendemos o quanto nos pode ajudar a viver a nova situação com mais sensibilidade. Quantos, por exemplo, tornam-se ricos e são incapazes de ser sensíveis aos pobres, tendo uma vez estado na mesma situação!

Podemos viver ainda fantasias a respeito de nós mesmos, que na verdade nos caricaturam. Elas podem nos elevar demais, ou nos rebaixar excessivamente. Nem sempre temos uma exata compreensão do que somos: do que existe de bom, de qualidades e potencialidades; bem como do que existe de limitado, de realidades que precisam de ser transformadas com o passar do tempo.

Essa realidade fantasiosa leva-nos a viver com máscaras e assumindo papeis. O autor americano Jonh Powel, em seu livro: Arrancar máscaras e abandonar papeis, denuncia essa situação, convidando a trilhar um caminho de autenticidade, que é a base para um crescimento verdadeiro. Uma construção que não leva em conta o terreno sobre o qual se eleva, mais cedo ou mais tarde cairá em ruinas.

Mas a desconfiguração do nosso ser pode se dá através de algumas tentações que caracterizam a situação atual. A tentação do fazer, onde pensamos que somos, na medida em que fazemos. A sociedade do capital tende a descartar quem não produz. Em certas pretensões atuais, há essa mentalidade. Somos antes de fazer. Este é, na verdade expressão daquele. É o ser que deve configurar o fazer. Não basta elencar uma série de ações para dizer: eu sou o cara!

Podemos também viver atrelados ao que pensam de nós, tanto em negativo como em positivo. Na busca de sermos reconhecidos e tornar-nos importantes, buscamos viver antenados ao que dizem de nós. E por isso, podemos desenvolver várias atitudes para trilhar o caminho do sucesso. Uma delas é a bajulação, onde procuramos, através de um caminho de falsidade, manter o status quo da nossa vida.

Em sintonia com a sociedade consumista, uma das tentações modernas é: pensar que sou o que tenho. Roupa, casa, carro posição social são os parâmetros que utilizamos para estabelecer que uma pessoa “é”. Tratamos os outros a partir desses critérios e almejamos tê-los para vivermos a falsa ideia de que somos.

O valor que está em questão em tudo isso é a verdade, para consigo em primeiro lugar e para com os outros. Nossa vida pode se tornar uma estória e não uma história. O desafio é ser nós mesmos em todas as situações. O mártir é, nesse sentido, expressão de compromisso com a verdade. O que importa é ser, dando-nos conta que se trata de um processo, que estamos em construção e que queremos ser o melhor de nós mesmos. Como já disse alguém: quero ser eu mesmo melhorado. Portanto, a questão da vida não é fazer, aparecer, ter, mas como diz o poeta inglês, ser: “ser ou não ser eis a questão!”

Pe. Pedro Moraes Brito Júnior

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